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A Importância da Intensidade do Contacto

por: Cor. Netto de Almeida

Por razões que seria demorado explicar, vi-me envolvido um dia, em conversas que têm a ver com a “importância da intensidade do contacto na condução do cavalo de obstáculos”. E isso levou-me a considerar que seria interessante escrever qualquer coisa relacionada com o assunto, até para arrumar as ideias.Para que o salto seja executado com correcção, é necessário que o cavalo seja conduzido de tal forma que os factores do salto, (elementos que condicionam a forma trajectória) sejam os óptimos para o tipo de salto que há que transpor. Considero que os referidos factores são a velocidade, a impulsão, o equilíbrio (do movimento de que o cavalo vem animado), e o ponto de batida, sendo que os três primeiros devem vir regulados de longe, deixando para perto do salto a regulação do ponto de batida por ser aquele que, determinando o início da trajectória, define a sua colocação em relação ao salto.

Assim podemos dizer que:• quanto maior for a velocidade, mais abatida será a forma da trajectória.• quanto maior for a impulsão, mais “redonda” será a trajectória.• quanto mais pronunciado for o equilíbrio, também mais “redonda” será a trajectória.

Para sermos capazes de regular facilmente estes factores, é preciso que o cavalo tenha adquirido o estado do ensino a que chamamos “cavalo sobre a mão”, e que se define como sendo o do cavalo que “procura e mantém o contacto com a mão do cavaleiro”. Na realidade, neste estado, se o cavaleiro cede um pouco a mão o cavalo estende o pescoço para manter o contacto e põe mais peso nas espáduas (o que pode favorecer a passagem de uma vala, por exemplo), mas se o cavaleiro lhe “levanta” um pouco a atitude do antemão, ele aceita o aumento do equilíbrio pedido sem resistir o que pode favorecer a passagem de um vertical. Com um cavalo assim o cavaleiro pode escolher a intensidade de contacto de que mais gosta e que pode ser função, por exemplo do seu tacto equestre e da sua colocação em sela.Daquilo que escrevi até aqui, não me apareceu qualquer razão para considerar a intensidade do contacto como um dos factores do salto. O que necessariamente aconteceria se ela tivesse directamente influência na forma da trajectória. Devo dizer que nunca me passou pela cabeça considerá-la como tal, nem nunca vi nenhum autor dar-lhe importância. Eu julgo que a importância da intensidade do contacto vem especialmente da necessidade de encontrar um bom equilíbrio, por isso vou analisar mais profundamente este factor. O equilíbrio consegue-se por meio de acções devidamente coordenadas e alternadas, de produção e de retenção da propulsão. E é na alternâncias destes “lançar para diante” seguido de “espera aí, que tanto não”, que o cavalo se vai fechando e, portanto, equilibrando. Mas nem os cavalos nem os cavaleiros são todos iguais, por isso vou raciocinar perante alguns cenários.

Cavalo naturalmente equilibrado: com este cavalo eu posso pedir bastante equilíbrio sem que ele perca a impulsão, pelo que o contacto pode ser ligeiro.Cavaleiro com muito tacto equestre e com boa colocação em sela: este cavaleiro é capaz de fazer acções de perna e de mão muito precisas, suaves e com bom acordo de ajudas, pelo que pode conseguir uma condução com bom equilíbrio e, portanto, com um contacto ligeiro.

Cavalo retivo ou fraco de trás ou pouco equilibrado naturalmente: se eu pedir a este cavalo um equilíbrio que lhe seja difícil, ele vai começar a perder impulsão. Como eu não quero que isso aconteça a nenhum preço, tenho que limitar a minha exigência no que respeita ao equilíbrio. E não é de admirar que, com pouco equilíbrio o cavalo tenha necessidade de um contacto forte. O que é fundamental, quando é necessária tal intensidade de contacto, é que o cavalo ceda a uma variação pequena desse mesmo contacto. Por exemplo: se o cavaleiro tem necessidade de montar com um contacto de 2 ou 3 Kg, é preciso que o cavalo seja capaz de obedecer a uma variação de 200 ou 300grs. Caso contrário a equitação deixa de ser um prazer e a regulação dos factores do salto um problema difícil de resolver.Cavaleiro com pouco tacto equestre ou com uma deficiente colocação em sela: este cavaleiro tem dificuldade em conseguir um bom acordo de ajudas pela sua falta de tacto, e de conduzir com ajudas suaves e precisas devido à sua deficiente colocação em sela, razões pelas quais vai ter dificuldade em ensinar e conduzir um cavalo ligeiro.

Na minha vida hípica montei cavalos que necessitavam de um contacto forte e cavalos que podiam, e/ou deviam, ser conduzidos com ligeireza. E tive que me adaptar a uns e a outros e ensinar uns e outros de modo a tirar deles o melhor rendimento possível. Só procurando isto um cavaleiro é capaz de montar e ensinar qualquer cavalo. No que não acredito é em noções que tendem a ser demasiado estandardizadas, como, por exemplo, na que afirma que os cavalos alemães só saltam com um contacto forte. Para mim cada cavalo é um caso sejam os cavalos alemães, chineses ou argentinos.Penso que a importância que se quer dar à intensidade do contacto que deve existir a caminho do salto é uma falsa questão. O que se passa na realidade é que o cavaleiro de obstáculos tem que ser primeiro que tudo, CAVALEIRO, e só depois, DE OBSTÁCULOS.

Quero com isso dizer que ele tem que ser capaz de conduzir o seu cavalo, a caminho do salto ou fora dele, nas condições de velocidade, impulsão e equilíbrio que quiser. E para isso tem que ser capaz de ensinar e sujeitar o seu cavalo, e utilizar, conforme as características do cavalo que monta e as suas próprias, a intensidade de contacto que melhor resulta para o fim em vista. O que tem necessariamente que acontecer é o cavalo ser conduzido, dentro da velocidade escolhida, andando bem para diante e equilibrado, o que é difícil se o andamento não for cadenciado e o cavalo não marchar direito, entre outras características necessárias. Por isso me parece que a intensidade do contacto não pode ser considerada como factor do salto, mas, quando muito, como factor dos factores do salto. E, assim sendo, não pode ter a importância que lhe querem dar.

Não quero acabar sem me referir às condições de uma variação de contacto na última passada antes do salto ou no momento da batida. Se, nesse momento o cavaleiro diminuir bruscamente o contacto (puser em falso) arrisca-se a fazer com que o cavalo derrube o obstáculo por ver o seu equilíbrio comprometido pela perda de um contacto (forte ou fraco) que o mantinha.

Por outro lado se o cavaleiro aumentar o contacto no momento da batida faz com que o cavalo descreva uma trajectória com mais uns centímetros de altura, mercê de um equilíbrio que foi reforçado com a retenção resultante do aumento de contacto. Mas é preciso guardar esta “arma” para casos excepcionais, como seja a transposição de um salto excepcionalmente delicado, em virtude de a retenção numa altura tão crítica poder causar perda de impulsão e assim contribuir para tirar confiança ao cavalo. Para terminar eu diria que penso que se está a “fulanizar” demasiado esta questão. Com isto quero dizer que tenho que admitir que a melhor intensidade do contacto varia de cavaleiro para cavaleiro. Mas como cada um, como é natural, procura transmitir aquilo que sente, procura dar prioridade em transmitir a intensidade que utiliza. Coisa que não é primordial. O primordial será transmitir o grau de velocidade, impulsão e equilíbrio que melhor devem resultar para cada aluno em cada cavalo. O que é muito difícil de conseguir.

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