A psicologia de uma aposta
Quando apostamos numa corrida, os nossos cérebros estão mais ligados do que nunca. A todas as emoções que correspondem ao acto de apostar estão também associadas as várias razões lógicas, mais ou menos legítimas, que nos levaram a apostar num determinado cavalo ou num outcome específico. Mas tal como as nossas emoções, os nossos cérebros são mais falíveis do que muitas vezes somos levados a crer. Existem várias tendências cognitivas que nos podem conduzir a uma decisão errada, sendo que muitas delas fazem parte do processo de escolher, colocar, e antecipar uma aposta. Confiar cegamente na nossa intuição é, como sabemos, uma maneira pouco responsável de realizar uma aposta. Mas se nem sequer nos podemos deixar guiar pelos motivos lógicos que determinam as nossas decisões, é sequer possível realizar uma aposta de forma confiante e rentável?
Se por um lado é impossível “desligar” as tendências cognitivas falaciosas que coordenam a nossa actividade cerebral, por outro lado é possível ter em conta a vertente psicológica no momento de apostar. Fazê-lo pode ajudar-nos a realizar apostas de forma mais fiável e segura, mas é bem mais difícil do que parece.
Factos vs. Ilusões
A falibilidade das percepções humanas tem sido estudada e documentada pelo menos desde o tempo dos antigos filósofos gregos. Há milhares de anos atrás, o pensador metafísico Platão expunha uma teoria em que argumentava que toda a realidade não passava de uma ilusão. Segundo Platão, a realidade, tal como era percebida pelos humanos, não passava das “sombras” de uma realidade superior, um estado existencial “mais verdadeiro”. A célebre alegoria da caverna de Platão pode ser também aplicada ao mundo das apostas. Principalmente porque, no momento de apostar, somos muitas vezes confrontados com ilusões que podem parecer factos, e com factos que não passam, no final de contas, de ilusões. Existem várias vieses cognitivas conhecidas e investigadas pelos psicólogos que entram em cena no momento de realizar uma aposta, e quase todas elas estão relacionadas com a falaciosa tendência humana que existe para associar emoções e factos.
Anchoring e falácias de confirmação
As apostas hípicas movimentam muito dinheiro todos os anos, mesmo em Portugal, onde as corridas de cavalos não são tão populares como, por exemplo, no Reino Unido ou nos Estados Unidos. Neste sentido, existem imensas informações relacionadas com as corridas, que circulam online ou que são partilhadas pelos apostadores e tratadores. Nem todas estas informações constituem factos, mas muitas são extremamente relevantes no momento de escolher uma aposta vencedora. Estar o mais informado possível acerca de uma corrida é uma parte fundamental do processo de ganhar dinheiro com uma aposta. Mas os factos também têm um peso emocional no nosso cérebro, e muitas vezes somos condicionados de forma subconsciente a privilegiar uma informação em prol de outra.
Os psicólogos alertam para um fenómeno conhecido como anchoring. De acordo com vários estudos de ciências sociais, o anchoring é um fenómeno cognitivo em que o nosso cérebro processa uma primeira informação de forma falaciosa, admitindo-a como mais importante do que as informações conhecidas posteriormente. Basicamente, traduz-se na ideia de que os seres humanos têm tendência para admitir o primeiro facto que conhecem acerca de algo como o mais importante. A esta falácia cognitiva adiciona-se ainda uma outra tendência, conhecida como falácia de confirmação. Esta é a ideia de que, a partir do momento em que assumimos uma verdade, temos o hábito de procurar factos que confirmem essa mesma verdade, e de ignorar outros factos que a possam desmentir.
Imaginemos, por exemplo, que estamos “ancorados” à ideia de que um cavalo mais experiente tem mais possibilidades de vencer uma corrida. A partir do momento em que admitimos esta verdade, somos condicionados para aceitar factos adjacentes que a comprovem. Temos em conta, por exemplo, todas as corridas em que cavalos experientes venceram cavalos menos experientes. E ignoramos, simultaneamente, informações que nos explicam que um cavalo mais jovem tem uma condição física superior, logo vantajosa.
Apostar no mundo e ignorar a aposta
Seja no mundo das corridas de cavalos, das apostas desportivas, ou do poker online em 888, um dos erros mais comuns cometidos pelos apostadores está relacionado com a sua conexão com todos os factos que dizem respeito ao universo da sua aposta, mas não à sua aposta em concreto. Como assim? Peguemos num exemplo simples. Um sujeito desloca-se a uma corrida de cavalos, e existe um buzz enorme em relação ao cavalo X, que é admitido por todos como um novo campeão. Do ponto de vista da verdade objectiva, é irrelevante para o sucesso do cavalo X se a sua reputação fora da pista de corrida é ou não boa. Mas o apostador pode muitas vezes coordenar a sua aposta de acordo com este buzz. De resto, é assim que a maior parte das probabilidades são definidas à partida. Por outro lado, caso o apostador deseje não apostar no cavalo X precisamente porque não confia na sua reputação exacerbada, ele estará, ainda assim, a cometer uma falácia. No momento de apostar, certifique-se de que a sua opinião racional não está assente em verdades meramente adjacentes àquelas directamente envolvidas na sua aposta.