ActualidadeArtigos

ENE denuncia irregularidades nos Centros Hípicos do país…

Este documento que nos foi enviado pela ENE, da autoria do Coronel João Sequeira – Director da ENE e que transcrevemos na integra, foi enviado no início da semana passada para a ASAE. Apesar de acharmos prematuro a sua publicação online, pois devíamos dar tempo à ASAE para se pronunciar, achámos conveniente alertar os interessados, com o intuito de evitar situações confrangedoras.

Dr. António NunesPresidente da ASAE – Autoridade deSegurança Alimentar e EconómicaAvenida Conde de Valbom nº 981069 – 185 LISBOAC/C: Federação Equestre PortuguesaData: 14/04/2009N/Refª.:195/ENE/09

Assunto: Segurança nos Centros Hípicos nacionais

Exmo. Senhor

1. A Escola Nacional de Equitação (ENE) é uma associação de entidades públicas e privadas, sem fins lucrativos, que tem por missão executar a formação profissional dos recursos humanos do desporto equestre. Esta competência é-lhe conferida estatutariamente, por delegação da Federação Equestre Portuguesa (FEP) que, de acordo com a Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto (artºs 16º e 19º), tem competência para conferir os títulos desportivos e para o exercício em exclusivo de poderes regulamentares.

2. Foi fundada em Março de 2005, tem sede em Lisboa, mas actua no terreno desde o Minhoaos Açores, numa rede, actualmente já com 32 sócios (Centros Hípicos e outras entidades), a maioria dos quais funciona como seu Pólo de Formação, ainda que mantenham,paralelamente, a sua autonomia e actividade.

3. De acordo com estudos já desactualizados, existem em Portugal cerca de 800 centros hípicos onde se praticam aulas de equitação, actividade equestre de competição, passeios acavalo e de atrelados (randonnée), concursos de atrelagem, horseball, equitação de tradição portuguesa, equitação terapêutica (hipoterapia) e equitação de trabalho.

4. Muitos destes centros dispõem, complementarmente, de outras actividades desportivas e de lazer, como por exemplo o ténis, o golfe, a natação, a restauração e a hotelaria.

5. De acordo com as últimas estatísticas da Corbroker, o crescimento dos sinistros participados, cobertos por seguro, tem crescido na ordem dos 30 % ao ano, desde há mais de oito anos consecutivos. Note-se que dos eventuais 800 Centros Hípicos, nem 20% integram esta estatística, pois não têm seguro desportivo, nem estão filiados na FEP. Estamos certos que o aumento real dos sinistros, num desporto que não se quer “radical”, é bem maiordo que o de muitas modalidades onde o risco é a sua razão de ser.

6. Para além dos acidentes, a falta de condições higiénicas das instalações e de cuidados no funcionamento e utilização, dão origem a doenças não contabilizadas, especialmente em crianças e jovens menos precavidos, ou vigiados por pais e “professores” ignorantes, ou mal orientados.

7. Certamente em Portugal, mais de 75 % dos locais públicos onde se pratica o hipismo, são clandestinos face ao enquadramento jurídico existente, já de si cheio de lacunas: Não têm licença de funcionamento e alvará passado pelo Instituto do Desporto de Portugal – IDP, filiação na FEP, responsáveis técnicos qualificados, condições de higiene e segurança, enquadramento sanitário e onde é muito duvidoso que paguem impostos sobre as suas transacções e resultados. Estão, por isso, em clara e aberta concorrência desleal relativamente aos eventuais 25% mais ou menos cumpridores das leis e das normas estatuídas. Os seus encargos são menores, pois para além de não pagarem impostos, não investem em manutenção, em segurança, em equipamento, nem em capacidade técnica, pois recrutam pessoal não qualificado, tirando partido de uma clientela ignorante que escolhe unicamente pelo preço. Podem assim cobrar menos aos utilizadores ganhando muito mais. Enfim é um verdadeiro escândalo.

8. A fiscalização da construção compete às Câmaras Municipais, mas a parte mais importante, que é o funcionamento, compete ao IDP, a quem atribuíram missões impossíveis, como por exemplo a realização de vistorias técnicas e atribuição de alvarás, sujeitas a regulamentação que aguarda desde 1997 e 1999 a sua publicação. Uma utopia de enquadramento jurídico antagónico da redução do peso do funcionalismo público, atirando para o IDP com tarefas especializadas por modalidades e disciplinas, que vão desde a canoagem, ao futebol, ao tiro, à vela, ao hipismo (com as suas dez disciplinas) e a mais de uma centena de especialidades.

9. Esta situação tem vindo crescentemente a preocupar a FEP à medida que o desporto equestre foi deixando de ser monopólio dos militares e de umas dezenas de civis ricos, pela democratização operada, nos últimos 30 anos.  A ENE, nascida em 2005, iniciou logo acções formativas intensivas, pois ingenuamente ainda admitiu que o Estado não se poderia conformar com esta situação vergonhosa perante qualquer país europeu e não só.

10. Em 2008 a ENE conseguiu atingir níveis de formação nunca dantes sonhados, 50 acções, 320 formandos e 7.000 horas de formação profissional, quando em 2005 se realizaram 15 acções, 100 formandos e 470 horas de formação profissional.

11. Esta formação que envolve a utilização de cavalos e equipamento caro, requer da maioria dos alunos, que há muito deixou de ser rica ou militar e que não tem apoios financeiros de ninguém, altos sacrifícios pessoais e familiares, motivados uns por amor a este desporto, outros porque sonham entrar por aí no mercado de trabalho, tão difícil nas demais actividades. E o que é que se lhes depara? Centro hípicos clandestinos com os lugares técnico profissionais preenchidos por gente desqualificada, a trabalhar sem recibo nemsegurança social.

12. Começa hoje a ser muito difícil convencer alguém a arriscar enfrentar este tipo de concorrência desleal, da qual culpo unicamente as políticas governamentais de há muitos anos. Políticas assentes num quadro jurídico que não é para cumprir, antes é para figurar nas estatísticas viciadas de quem sabe ser essa a forma de manter os lugares que ocupa.

13. Os utopistas do liberalismo económico, apoiados por oportunistas do negócio fácil, sustentam ainda que também aqui as leis do mercado se regulam a si próprias, como não aconteceu recentemente na banca e noutros sectores das actividades económicas. Mas a evidência mostra à exaustão que os organismos do Estado têm uma função reguladora decisiva de todo o nosso futuro colectivo. Por isso e porque há muito sabíamos que o IDP nunca poderia resolver estes problemas, a entrada em cena há dois anos dos agentes da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), vistoriando os Centros Hípicos, representou uma luz de esperança que a todos os bem intencionados animou.

14. Esse facto encaminhou para a FEP várias organizações equestres, receosas das coimas e demais consequências do incumprimento e a ENE passou a ter uma maior procura de candidatos à formação de responsáveis técnicos, uma vez que existe um “gentleman” agreement com o IDP, em que os candidatos a responsáveis técnicos devem ter parecer favorável da Federação antes daquele Instituto os aceitar, ou seja, carecem de qualificação adequada assegurada pela ENE.

15. Os primeiros meses da intervenção da ASAE foram animadores, mas infelizmente passamos a receber, da parte dos Centros Hípicos e também dos nossos antigos alunos um mar de protestos pela forma como essas vistorias estavam a decorrer:Queixam-se eles, que foram preferencialmente vistoriados os Centros indicados por uma lista fornecida pelo IDP, ou seja, aqueles cujo registo ali se encontrava, que eram, nem mais nem menos, que os tais 25% registados, acontecendo, em alguns locais, que de duas instalações frente a frente, uma com responsável técnico e outra sem qualquer enquadramento, nem condições de funcionamento, o agente apenas visitou a que tinha o dito responsável, ocupando-se minuciosamente das exigências de natureza burocrática de interesse indiscutível, mas que não seriam aquelas que elevam a sinistralidade para os níveis actuais.

16. Mais se queixam que depois de visitados um número ínfimo da referida minoria dos tais 25%, nem os sobrantes dessa minoria, e muito menos os restantes 75% chegaram a ser vistoriados, voltando tudo à situação em que se encontrava.17. Dizem igualmente que certas Câmaras Municipais terão participado na indicação de Centros a visitar, o que nos parece uma boa ideia, mas parece-nos insuficiente e nem sempre seguro. Aconselharíamos medidas tão expeditas como perguntar aos Centros visitados onde estão os seus concorrentes desleais, ou, o que é mais simples ainda, perguntar à população “onde estão os cavalos”. Foi assim que a empresa Tejo de estudos de mercado encontrou. há cerca de 10 anos, 800 Centros equestres só no Continente, num estudo que fez para a ANTE, Associação Nacional de Turismo Equestre.

Não pretendemos “ensinar” nada a ninguém, pois estamos certos que, um pouco mais de cuidado e imaginação da parte dos agentes e seus chefes directos, dava para descobrir muita transgressão perigosa e fraudulenta no mundo equestre.Esperando com este ofício prestar um serviço ao País, desejo manifestar a disponibilidade desta Escola para qualquer cooperação que a ASAE entenda necessitar.

Com os melhores cumprimentos
Pela ENE
João Bilstein Sequeira (Cor.Ref.)Director

X