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Arqueólogos Descobrem as Primeiras Evidências da Prática de Polo – com Burros

Os ossos de um túmulo com 1.150 anos na China revelam que os burros não eram apenas usados como animais de carga.

O polo é conhecido como o “desporto dos reis”, um passatempo equestre que entretém os aristocratas há séculos. Mas os jogadores de polo nem sempre usaram cavalos. Uma nova investigação confirma que uma mulher da aristocracia chinesa praticava este desporto com burros – e que gostava tanto das emoções proporcionadas por esta atividade que até foi enterrada com os seus preciosos animais.

Investigadores chineses e norte-americanos descrevem esta descoberta na última edição da revista arqueológica Antiquity. É a primeira evidência física da variação específica deste desporto, conhecido por ljvu, descrito nas crónicas da época e retratado na arte, mas nunca confirmado no registo arqueológico até agora.

A figura de um burro da era da Dinastia Tang.

Acredita-se que o polo evoluiu a partir de jogos equestres desenvolvidos por nómadas na Ásia Central. Apesar de existirem evidências arqueológicas para o antecessor deste desporto na China de há aproximadamente 2.400 anos, o jogo, no qual duas equipas de cavaleiros competem para colocar uma bola numa baliza, viu a sua popularidade aumentar um milénio depois, durante a Dinastia Tang (618-907 d.C.).

Existem inúmeras referências ao polo equestre na arte e na literatura da Dinastia Tang, e muitos túmulos da mesma era apresentam artefactos e arte relacionados com o polo, incluindo murais nos mausoléus e figuras de cerâmica. Mas os estudiosos deste período estavam intrigados sobre um subconjunto de representações antigas deste desporto, que aparentemente mostram burros no campo, e não cavalos, num jogo chamado ljvu.

“Existem muitos exemplos de obras de arte chinesas que retratam mulheres, que se assume pertencerem a um estatuto mais elevado, a jogar polo com burros”, diz Brenda Lynn, porta-voz do Museu do Polo.

Burros de carga?

A primeira evidência arqueológica de polo com burros da era Tang vem do túmulo de Cui Shi, uma nobre que morreu no ano 878, em Xi’an, na região centro da China. Quando os arqueólogos abriram recentemente o túmulo, descobriram que este tinha sido saqueado algures nos últimos 1.150 anos. Os saqueadores levaram a maioria das coisas de valor, mas deixaram alguns objetos para trás, incluindo um epitáfio de pedra, um estribo de chumbo e vários esqueletos de animais aparentemente sem valor. Através das análises de ADN mitocondrial, os investigadores determinaram que pelo menos três dos animais enterrados com Cui Shi eram burros.

Para descobrir se os animais viviam as suas vidas como burros de carga, ou se eram usados para jogar polo, a equipa de investigação analisou os seus ossos. A datação por radiocarbono confirmou que os animais foram enterrados juntamente com Cui Shi, em vez de terem sido abandonados posteriormente por saqueadores. A análise isotópica revelou que os burros eram bem alimentados com enormes quantidades de plantas, provavelmente com milhete.

Por fim, uma análise biomecânica confirmou que os animais provavelmente não eram usados como burros de carga: quando os investigadores compararam os ossos dos burros enterrados com os ossos de burros selvagens e de carga, descobriram que os animais enterrados não caminharam lentamente como os outros. Em vez disso, os burros parecem ter corrido e mudado de direção com frequência – exatamente como uma montada de polo.

“Os burros raramente eram exibidos ou usados em desportos como os cavalos”, diz Fiona Marshall, arqueóloga e especialista em burros na Universidade de Washington, em St. Louis, que ajudou a estudar os ossos. “Esta descoberta revela que os burros também tinham um lugar como animais de estatuto elevado, e não eram apenas animais de baixo estatuto.”

Jogo perigoso

Mas porque razão Cui Shi escolheu burros – um animal que não é propriamente conhecido pela sua velocidade e agilidade? As partidas de polo da era Tang podiam envolver muitos perigos, e os investigadores suspeitam que os burros eram mais seguros e robustos do que os cavalos.

Bao Gao, o marido de Cui Shi, sofreu na pele esta lição. De acordo com a Xin Tangshu, a crónica oficial da Dinastia Tang, este homem de estatuto elevado do imperador Xizong tinha a sua própria paixão pelo polo, e encarava o desporto como uma maneira de obter prestígio militar, e como uma oportunidade para manter em forma as suas capacidades de equitação. E Bao Gao beneficiou realmente com isso, conseguindo a cobiçada posição de general devido às suas capacidades na prática deste desporto, mas só depois de perder um olho numa partida de polo.

Brenda Lynn, do Museu do Polo, diz que a arte é considerada uma indicação fidedigna da existência deste desporto pelos historiadores de polo, mas que, na ausência de uma confirmação arqueológica, “tentar determinar com exatidão as origens e as tradições praticadas em tempos antigos é algo que está frequentemente sujeito a especulação.”

E acrescenta, “é sempre emocionante obter mais detalhes que ajudam a confirmar quando, como e por quem o polo era praticado”.

Este artigo foi publicado originalmente em inglês no site nationalgeographic.com.

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