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Julgamento de Morfofuncionalidade em Cavalos Lusitanos

A IMPORTÂNCIA DA ADMISSÃO DE MACHOS E DO RIGOR EXIGIDO NAS AVALIAÇÕES

Texto: Bento Castelhano

A avaliação da morfologia na criação de cavalos é, efectivamente um tema da maior importância!Vejamos; é por essa via que se fornece aos criadores um referencial:

• de selecção para a conformação, tanto no que respeita à estética (“classe”), como às “peças” necessárias ao desempenho atribuido ao cavalo a julgar;

• para se poderem eliminar defeitos físicos limitadores da “máquina” animal; não nos esqueçamos que a “produção” que pretendemos do cavalo é o seu “trabalho”;

• para saber se os maneios alimentares, sanitários, etc, estão permitindo realmente exprimir os potenciais que projectámos nos momentos de planificação das coudelarias.Numa zootecnia antiquada, actualmente ultrapassada, as acções de selecção limitavam-se a privilegiar os animais melhor conformados, exclusivamente de acordo com um “padrão racial”. Ainda há muitos “sectores” na Nossa Raça Lusitana completamente dependentes deste preconceito. Eles continuam convencidos que se seleccionarmos para o “padrão” teremos cavalos fantásticos, polivalentes e imbatíveis em todas as disciplinas equestres… Para além de pensarem que preservam características genéticas…

Na morfologia, como nos demais parâmetros objectos de selecção, temos obrigação de criar efectivamente alguma homogeneidade para podermos gozar de “Imagem de Marca”, mas sem eliminarmos alguma variabilidade fenotípica, reflexo de variabilidade de características genéticas! Explicamos com recurso ao absurdo: no dia em todos os nossos cavalos fossem absolutamente iguais entre si, não valeria a pena seleccionar, pois em cada geração sairiam sempre iguais.

Por outro lado, a variabilidade de características físicas e de talentos, tem sido o que nos tem permitido (aos Lusitanos) ter tanto sucesso em disciplinas equestres tão diversas: Toureio (talvez a mais nobre na origem e evolução da Raça), a Atrelagem, o Ensino, a Equitação de Trabalho, etc. Vulgarmente esta Variabilidade tem sido confundida com Versatilidade.Posta esta reflexão entraremos em algum detalhe no julgamento propriamente dito.O trabalho da Selecção vive da Informação ao criador! A morfologia não é excepção!! Se quem produz não tem acesso aquele que avalia os seus animais, facilmente caímos nos problemas de só alguns acederem a essa informação. Por outro lado, quem está menos informado, produz necessáriamente pior, será pior avaliado e tentado a pensar que há “más vontades” no seu caso concreto. Mas “Informação” é um processo biunívoco: do juiz para o criador, mas também o inverso!Não deixa de ser curioso pensar em quantos casos de Criadores e Associações conhecemos que, primeiro pensam em produzir e só depois, mas mesmo assim nem sempre, informar-se!…

No actual Regulamento da Raça, de conhecimento fundamental, existem duas formas distintas de avaliação morfológica, as duas importantes como forma de coleccionar avaliações para o “Stud-Book” do PSL:

1. a inscrição no Livro de Adultos (LA)(vulgarmente conhecida como “pontuação”), que determina se um animal é ou não aprovado como reprodutor;

2. os concursos de modelo e andamenos nos Campeonatos Nacionais dos diferentes países.Em qualquer dos casos, a base do trabalho dos juízes tem de ser o Padrão da Raça. A descrição deste, para além de aborrecida, é de facílimo acesso: “site” da APSL, do Ministério da Agricultura de Portugal, inumeras revistas do Festival Internacional do PSL, etc, etc, etc.

Aconselhamos, então, os senhores criadores a consultar este documento em qualquer das fontes! Mas, neste artigo, que se pretente sucinto e interessante, parecem-nos de previligiar, os aspectos e critérios nos quais os juízes se baseiam para traduzirem em notas de zero a dez cada um dos parâmetros avaliados.Numa avaliação para o Livro de Reprodutores a grelha tem como itens a avaliar:1. Cabeça e pescoço2. Espádua e garrote

3. Peitoral e costado4. Dorso e rim (coeficiente 1.5)5. Garupa6. Membros (coeficiente 1.5)7. Andamenos (coeficiente 1.5)8. Conjunto de formas (coeficiente 1.5)Os items com coeficiente foram os que a Comisão, que iniciou os trabalhos de organização do “Stud-Book”, considerou serem pontos mais débeis na raça, como tal com mais influência na avaliação dos reprodutores.A escala de avaliação funciona tendo como critério o seguinte: #10 = Excelente #  9 = Muito bom # 8 = Bom # 7 = Suficiente # 6 = Insuficiente # 5 = Medíocre # 4 = Mau # <=3 Muito mauNuma inscrição para reprodutor, com uma nota de “4”, duas notas de “5” ou menos e três notas de “6” ou menos, o animal é Reprovado.Para o Livro de Adultos a apresentação deve ser muito cuidada; um animal magro, sem “toilette”, mal apresentado na forma como é montado, causará ao juiz as maiores dificuldades em ser objectivo e, como tal, impossibilitando-o de dar boas notas.

Quanto melhor a preparação maiores garantias de bons resultados.Os aspectos raciais encontram-se mais ligados às extremidades: cabeça, orelhas, membros, cauda, etc. e são avaliados nos parâmetros respectivos. Já os aspectos mais correlacionados com a função são mais independentes da origem étnica: a locomoção é dependente das alavancas ósseas, as quais devem privilegiar braços (de alavanca) compridos e respectivos ângulos de ataque fechados, além de adequadas combinações entre “peças”.

Na Raça Lusitana a avaliação morfológica é sempre dependente da dos andamentos! Primeiro avaliam-se os movimentos e, só depois, a conformação. Aqui encontramos nós muitas das explicações para certas notas, aparentemente, pouco concordantes com o aspecto físico de alguns animais.

Recorremos aos exemplos para melhor compreender:

• De que me serve um pescoço com um bordo superior claramente mais desenvolvido que o inferior, uma ganacha estreita e um comprimento médio muito harmonioso com a silhueta do corpo, se no movimento esse pescoço coloca sistematicamente problemas de equilíbrio? Neste caso a nota a atribuir terá de ser claramente mais baixa que aquilo que a conformação deixaria pensar.

• Um dorso mergulhante na sua projecção desde o rim para o garrote, mas que mostrou um passo onde todo o corpo ondula “desde o nariz à cauda”, com uma clara facilidade nas transições de andamentos, passagens dos cantos e “conexão” em geral deverá ter uma nota claramente melhor que a ditada exclusivamente pela forma da região.

Ou seja, além da conformação física verificada no animal e da sua comparação com o Padrão Racial, devemos levar em conta a influência de cada “peça” na locomoção, tanto de forma positiva (desempenho superior ao expectável pela conformação) como negativa.Esta Raça foi desde sempre “de sela” e só recentemente, para alguns, de exposição. Desde sempre que os criadores que mais influenciaram os momentos históricos do Lusitano, se nortearam em produzir cavalos úteis e não exclusivamente dentro do “padrão”. Isso permitiu-nos chegar ao momento actual com este potencial imenso em campos tão diversos. O Exame de Aptidão ao Livro de Reprodutores para machos é sempre acompanhado de enormes controvérsias. Poucos, mesmo muito poucos, Criadores são conhecedores do Regulamento da Raça. Documento que eles próprios aprovam em Assembleia Geral…

Posso afirmar sem margem de erro que a Massa Associativa, claro que com honrosas excepções, é extremamente avessa a objectivar a Selecção da Raça Lusitana para métodos rigorosos e de bases científicas. Mesmo alguma tentativa de implementação de um “esquema de selecção” ainda que “tosco”, sofreu recuos irremediáveis após curtíssima aplicação!Tem restado aos gestores da Raça, como única forma de passar algum sentido crítico aos criadores, a exigência na escolha dos reprodutores, dando indicações aos juízes para um maior rigor no caso dos machos, pela potencialmente maior difusão genética.A escolha de reprodutores na Raça Lusitana peca por ser praticamente isenta de Selecção e nunca pela exagerada exigência dos juízes.São, no caso dos garanhões, raríssimos os animais dignos de destaque em qualquer função que tenham sido reprovados. Ou seja, apenas são afastados cavalos manifestamente inferiores ou na sua fronteira.Selecção, como método de Melhoramento Genético, implica a escolha dos animais mais performantes para o objectivo de selecção. Tal como afirmámos no início, o Padrão Racial é um referencial para a conformação e não um objectivo de selecção “per si”. Quantos menos animais escolhermos em cada geração para o nosso objectivo (Pressão de Selecção) maior será a exigência e, tendencialmente, maior o Progresso Genético. Selecção, independentemente do método, terá portanto de implicar escolha de poucos dos animais e nunca a aprovação da maioria dos nascidos.Exigência e Rigor são contrárias a Permissividade, também em Selecção.

Caros Amigos: é muito mais difícil fazer cavalos de qualidade comprovada (que seguramente não reprovam nas actuais Provas de Aptidão para Reprodutores) que transferir para os Juízes da Raça a responsabilidade de certificarem a qualidade não produzida!

02.02.2012

 

 

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