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Jogos Olímpicos 2024 – Dressage a “verde e vermelho”

A participação portuguesa nos Jogos Olímpicos de Paris 2024, em que os conjuntos participantes não se conseguiram qualificar para seguir em frente, introduz-nos uma importante oportunidade para reflexão e retrospetiva histórica à volta, não só dos resultados, mas igualmente dos objetivos e ambições para o futuro da modalidade, nunca esquecendo que estar presente e lutar bem, é já uma vitória para o desporto equestre português.

As eleições para a FEP avivam ainda mais a pertinência da presente incursão.

A questão dos resultados é fundamental para os cavaleiros, mas mais importantes ainda por constituírem as bandeiras de desenvolvimento do desporto equestre em Portugal. São estas esferas de marketing que viabilizarão a entrada de jovens praticantes e decorrentemente um aumento exponencial do ritmo competitivo, com a possibilidade de crescimento do número e frequência de provas.

Se pretendermos ter resultados diferentes, e porque não cimeiros, temos obrigatoriamente de fazer diferente. Este é um dado inquestionável.

Para todos aqueles que estão satisfeitos com os resultados atuais e do passado que têm pautado o caminho de Portugal na modalidade, este é o momento de “se desmontarem” deste artigo, e prenderem o vosso tempo e atenção a outros assuntos que considerem de maior pertinência e atualidade, pois este artigo pretende apontar alguns caminhos que possam contribuir para colocar Portugal no caminho da disputa dos lugares cimeiros.

Se conseguimos alcançar feitos notáveis no futebol português da atualidade, a eles não são estranhos a quantidade massiva de jovens praticantes que integram a prática da modalidade, número que jamais será alcançado no desporto equestre, nem em Portugal, nem no resto do Mundo, mas que nos compete tudo fazer para a alteração deste “estado de alma”.

Somos um país pequeno onde todos se conhecem, e onde igualmente existe uma tendência para personalizar tudo aquilo que obrigatoriamente deve ser encarado num formato genérico.

É fundamental deixar claro que não está em causa a qualidade dos cavaleiros, ou mesmo das pessoas, direta ou indiretamente envolvidas, o seu profissionalismo, ou mesmo todo o trabalho, esforço e imensa dedicação que é necessário investir para se conseguir chegar a uma representação olímpica, que é sempre de indiscutível mérito. Não particularizarei ou comentarei qualquer uma das prestações dos nossos conjuntos em 2024.

Lanço uma pergunta simples: os resultados de 2024 são os desejáveis e que Portugal ambiciona enquanto veículo promotor da modalidade no nosso país?

Ao lermos os comentários e opiniões manifestadas no submundo da internet, onde tudo prolifera e mais abunda a falta de respeito pelas diferenças de opinião, podemos constatar a polarização dos extremos de opinião prevalente, uma entusiástica e apaixonada satisfação pelos resultados obtidos, e outros no extremo oposto, que consideram que os resultados ficaram aquém das expectativas. Ambas são legítimas e devem ser obrigatoriamente respeitadas, sem os indesejáveis despropósitos, que não beneficiam em nada o desporto, e que dão uma deplorável imagem de falta de união e de pouca ou nenhuma educação.

Necessitamos de serenidade e foco na mudança, pois no Mundo, essa é a tónica dominante.

O primeiro requisito de esforço impele-nos a estudar o passado, pois não existe futuro sem passado, e de seguida direcionar a nosso entendimento para perceber o que os países que lideram a modalidade têm feito para reiteradamente fazerem soar o hino e trazerem para “casa” os metais (bronze, prata e ouro) que dão honra ao país e prestígio aos atletas.

Fernando Paes / Matamás 10º lugar nos Jogos Olímpicos.

Os Jogos Olímpicos da era moderna integraram competições equestres apenas a partir de 1912. A primeira participação portuguesa em ensino ocorreu em Londres, no ano de 1948, onde Portugal conseguiu o terceiro lugar por equipas, e onde se classificaram em 10.º, 11.º, e 13.º lugar, os conjuntos Fernando Paes/Matamás, Francisco Valadas Jr/Feitiço, Luís Mena e Silva/Fascinante. Para além destas destacadas participações, no ano de 1956, em Estocolmo, o conjunto António Pereira de Almeida/Feitiço obtiveram o 12.º lugar. Já no ano de 1960, em Roma, António Reymão Nogueira/Greek Warrior classificaram-se em 10.º lugar.

Em anos mais próximos à atualidade, as melhores prestações portuguesas couberam a Gonçalo Carvalho/Rubi, no ano de 2012 em Londres, e a Rodrigo Torres/Fogoso nos JO de Tóquio em 2021.

Recordamos a notícia publicada pelo Jornal Record:

O português Gonçalo Carvalho terminou no 16.º posto da final de ensino individual dos Jogos Olímpicos de Londres’2012. Gonçalo Carvalho e “Rubi” alcançaram uma pontuação de 77.607, bem longe dos 90.089 da britânica Charlotte Dujardin, que conquistou a medalha de ouro.

Recordamos a notícia publicada pelo Jornal Público:

Rodrigo Torres supera-se na final olímpica de dressage

Depois de já ter marcado presença na final por equipas, obtendo um oitavo lugar, Rodrigo Torres fechou o concurso individual na 16.ª posição, deixando atrás de si uma cavaleira espanhola e uma canadiana. A medalha de ouro foi entregue à alemã Jessica von Bredow-Werndl (e ao seu TSF Dalera), com 91,732%.

É muito importante rever a nota da participação Portuguesa na modalidade de obstáculos em 1924, em Paris, que revela um comentário de época muito indiciador da matéria que compõe a alma Lusa, e que descreve o seguinte: “embora se reunisse o melhor que frequenta as nossas pistas, eles estavam longe, bem longe mesmo, da categoria dos seus adversários e a nossa victória mais se deve à alma dos nossos cavaleiros, à sua coragem inexcedível, à confiança absoluta em cumprir a sua missão, que ao valor dos seus cavalos que, porque não dizê-lo, eram olhados com desprezo, antes da tarde de 27 de Julho, em Colombes. O resultado foi tão inesperado que não havia uma bandeira da República Portuguesa para hastear na cerimónia de entrega das medalhas olímpicas. Os cavaleiros recusaram-se a subir ao pódio e teve de ser improvisada uma bandeira com um pedaço de tecido verde e outro vermelho”.

Passados 76 e 64 anos, Portugal não conseguiu superar na modalidade de ensino, os resultados obtidos nesse tempo, nomeadamente um 10.º lugar e um terceiro lugar por equipas.

Em Portugal estamos generalizadamente focados na elevação do cavalo Lusitano no ensino, e bem, mas é incorreto negligenciar o potencial das restantes raças afetas à criação nacional, pois o bom-senso e sentimento de progresso ditam a necessidade de haver uma concorrência saudável entre raças – os monopólios são enclaves ao progresso.

Preocupado com as questões de melhoramento animal na raça Lusitana, enquanto um todo, o saudoso Sr. José Manuel de Mello [1929-2009 – um dos maiores empresários portugueses que o jornal Expresso apelidou de «o empresário sem medo», foi um empreendedor notável e de grande visão para sempre ligado no imaginário português à LISNAVE. Herdeiro dos destinos da Companhia União Fabril (CUF), que o Avô Alfredo da Silva fundara, e da sua cultura empresarial], ex-presidente da APSL, apontou caminhos de modernidade e foi injustamente acusado, pelos mais conservadores, de pretender “germanizar” a raça. Acabou por se demitir das funções, advindo em funções o Sr. Dr. Pedro Ferraz da Costa.

Lá por fora testa-se, radiografa-se, e licencia-se há décadas. Provas de 14 dias, provas de 50 dias, que constituem um hino ao mérito funcional dos recursos genéticos associados aos cavalos de desporto. Não é de estranhar a velocidade de progresso genético e os êxitos alcançados em raças como a KWPN, Oldemburgo, Westfália, Hanoveriana. Não há nacionalismo ou sentimentos de amizade que se consigam sobrepor à objetividade dos resultados internacionais alcançados por estas raças.

Em Portugal a testagem de reprodutores iniciou-se em 1934 e funcionou ininterruptamente até ao advento da revolução de 1974. Desde aí, e até hoje, nenhuma associação ou organização as retomou com a mesma frequência e determinação férrea, enquanto motores do mérito que conferem sustentabilidade às raças de cavalos de desporto.

Com a utilização de reprodutores atualmente testados e licenciados nos países mais evoluídos da criação Mundial, Portugal poderá conseguir, com o tempo e persistência (é um trabalho que requer como ingredientes: o conhecimento; a firmeza nas dificuldades; e a constância na prossecução dos objetivos), avanços objetivos e significativos na performance desportiva dos animais aqui criados. Estruturando as nossas associações de criadores com idênticas ferramentas de seleção e melhoramento, daqui a uns anos, não teremos a mesma necessidade de trazer de fora, pois teremos igualmente em Portugal reprodutores devidamente testados na função que constitua o objetivo de cada coudelaria.

Portugal tem o Cristiano Ronaldo no futebol… um jogador metódico, exemplarmente trabalhador e talentoso. Porque não trabalhar a sério para construir para a dressage um futuro de idêntico prestígio alcançado pelos nossos atletas do futebol? Um lubrificante obrigatório é fazer baixar drasticamente a média etária dos órgãos executivos dos centros de decisão das associações e Federação, e essa lufada de juventude, predisposta à mudança, ir lá fora absorver o conhecimento inerente à operacionalidade das associações e organizações de sucesso, e deixá-los modernizar, para se fazer aquilo que nunca se fez, e para se alcançar aquilo que nunca se alcançou.

Sonhar e ambicionar fechados em conservadorismo etariamente elevado… é tradicionalmente bonito, fica bem, e é politicamente correto! Mas lamentavelmente deixar-nos-á permanentemente na esteira do nível onde poderíamos chegar.

Ambicionar e ficar muito satisfeito com 77% quando os outros andam nos 90%… seguramente que a todos fará pensar!

Rodrigo Almeida

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