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Feno esse desconhecido

Texto: Gillian O’Donnell

O feno é talvez o alimento menos tido em conta do que damos aos nossos cavalos hoje em dia.Temos um tão grande leque de concentrados, aditivos, suplementos vitamínicos e minerais, sem falar na tradicional aveia, no farelo, na cevada e no milho esmagados, que as pessoas têm a tendência a pensar que o feno é um alimento de segunda, que só serve para apoiar os concentrados em vez de ser o alimento fundamental que é na realidade.

Os cavalos são obviamente herbívoros e o feno é afinal uma forma de erva seca. Para a digestão do cavalo é a melhor coisa a seguir à erva. Na verdade o feno maduro, dos seis aos doze meses de fenado tem mais valor nutritivo do que a erva da qual é feito, porque durante os seis meses após a colheita do feno há tempo para os amidos (nitrogénio não proteico) contidos na erva se transformarem em verdadeira proteína, elevando assim o valor alimentar do produto seco. Nunca ouvi falar de problemas digestivos provocados por sobrealimentação de feno (sem ser de trevo) mas são vulgares os casos de cólicas e laminites provocadas por excesso de erva ou palha. A palha não é um alimento próprio para cavalos.

O feno de prado cultivado, e de primeira pode ser só por si o suficiente para alimentar cavalos em trabalho moderado. Todos os livros que li até hoje discordam desta teoria, recomendando grandes quantidades de concentrado para cavalos em trabalho; mas eu sei por experiência que, salvo raras excepções, essa não é a resposta certa. O segredo consiste em comprar feno da melhor qualidade, do tipo que o seu cavalo adora e assegurar-lhe o fornecimento constante a seguir ao trabalho. Claro que é mais caro que o feno medíocre, mas mesmo assim é  mais barato do que dar feno de qualidade duvidosa encimado por concentrados dispendiosos.

Dependendo do seu tamanho e raça, um cavalo numa dieta completa de feno (ou praticamente), consome entre 9 a 13 quilos diariamente – facto que sem dúvida fará com que muitos tradicionalistas se atirem ao ar horrorizados: “terá uma barriga de feno enorme” e “como pode trabalhar se está sempre de barriga cheia?” costumam ser os comentários feitos sobre este método de alimentação.As respostas são: primeiro, se o feno for realmente de primeira qualidade terá uma menor proporção de fibra rija que ocupa muito espaço no baixo intestino, provocando a dita barriga de feno. Quanto pior for a qualidade do feno maior é a quantidade de fibra nele contida. Segundo, é necessário utilizar o bom senso no regime alimentar. Por exemplo, se trabalhar o seu cavalo de manhã faça-o antes de lhe dar o pequeno-almoço; quando de volta a casa ele pode ter feno à disposição todo o dia e grande parte da noite.

Poderemos dar sempre à noite uma refeição de, farelo humedecido, cenouras cortadas e um pouco de ração concentrada; esta refeição permite-nos administrar quando necessário suplementos de vitaminas/minerais, desparasitantes e outros medicamentos de forma usual.

À parte de ser um excelente alimento por si só é uma importante ajuda à digestão de concentrados, aveia, cevada e milho. Administrados por si só os concentrados podem formar um bolo no fundo do estômago que quando misturados com os sucos digestivos podem formar uma massa espessa nos intestinos, de mobilidade difícil para os movimentos ondulantes naturais dos mesmos.

Os resultados são óbvios – indigestão talvez ou excesso de fermentação, resultando em ruptura do intestino. A parte fibrosa do feno actua como ajuda mecânica essencial à digestão, introduzindo-se na massa de concentrados, separando-a e expondo-a assim à acção dos sucos digestivos.  Também providencia volume para expandir os intestinos, estimulando-os para que trabalhem melhor e dando ao cavalo a sensação de plenitude e satisfação que todos esperamos após uma boa refeição.Mas a nutrição não é a única qualidade essencial do feno. Com o mesmo grau de importância está o imenso valor recreativo que representa para o cavalo quando estabulado ou num padoque desprovido de pasto. Os cavalos passam muitas horas descontraídos com o feno, fazendo exactamente aquilo para que a natureza os criou ou seja, comer devagar e quase continuamente, mantendo o seu sistema digestivo a funcionar e a sua mente feliz e ocupada.

É triste ver um cavalo no fundo da boxe, orelhas para trás com uma expressão de tristeza e aborrecimento profundo, por falta de entretenimento para o ajudar a passar as longas horas. Durante o dia pode ir observando o que se passa no pátio, mas imagine-se o que será durante a noite enquanto nós dormimos, esquecidos do que nos rodeia.

Os cavalos não dormem várias horas seguidas, como nós; provavelmente só dormem intermitentemente durante cerca de 3 das 24 horas existentes.  Na maioria dos casos o feno já estará acabado por volta da meia-noite, ficando o cavalo sem alimento – uma situação que lhe é pouco natural – em detrimento tanto da sua digestão como do seu estado mental.

Os cavalos habituados a ter feno disponível permanentemente não se enfartam com ele deglutindo-o avidamente, comem-no lentamente como a natureza pretende; tenho observado que cavalos nesta dieta nada sofrem se lhes forem administrados 6,5 kg de feno à noite e se forem trabalhados de manhã antes de lhes atribuir novamente alimento.

Se se comprar a um fornecedor sério, feno de qualidade mas em pequenas cargas e alimentarmos o cavalo quase exclusivamente desse feno, sai mais barato do que o método usual de concentrados mais feno nos intervalos – e o seu cavalo andará satisfeito e saudável.

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