Neonatalogia
Texto: Dr. Henrique Cruz
Foto: Coudelaria Monte da Tramagueira
Para todos os criadores de equinos, o nascimento de um poldro é o culminar de uma espera de 11 meses, quando podem finalmente ver o produto de todo o trabalho investido. No entanto, o parto é apenas o início de um longo percurso em que são necessários vários cuidados essenciais para garantir que o poldro se desenvolva de modo saudável até ao desmame e daí em diante.
Neste artigo vamos discutir alguns eventos fisiológicos e problemas comuns com que são defrontados muitos poldros durante o crescimento.
AS PRIMEIRAS 24 HORAS
Um poldro recém-nascido saudável deverá sentar-se na posição esternal (sobre o seu peito e barriga) ao fim de 10-20 minutos após o parto, levantar-se ao fim de uma hora, e mamar vigorosamente ao fim de 2 horas. Se o comportamento do seu poldro se desviar significativamente deste padrão deverá chamar seu médico veterinário de imediato. As causas mais comuns de fraqueza neonatal incluem infeção bacteriana (septicémia), asfixia durante o parto e /ou imaturidade. A saúde de um potro pode deteriorar muito rapidamente pelo que a intervenção atempada por parte do médico veterinário pode fazer a diferença entre a vida e a morte.Durante este período, a égua deverá expulsar a placenta nas primeiras três horas após o parto. A égua deverá ser observada para sinais de traumatismos pós-parto ou cólica. Deve tambem verificar-se se o ubere está cheio e se a égua produz quantidade suficiente de colostro. Como medida de precaução proactiva, recomenda-se que o seu médico veterinário faça um exame completo à égua e ao potro dentro das primeiras 24 horas após o parto.
Este exame foca-se nas seguintes áreas:
• Avaliação da égua e poldro para identificação de traumatismos relacionados com o parto, como por exemplo hemorragia ou hematomas uterinos ou cervicais; ou fratura de costelas ou rotura de bexiga no poldro recém-nascido.• Exame da placenta para verificar que não ficou nenhum pedaço preso ao útero e para descartar sinais de infecção ou outras anomalias.
• Medição de anticorpos (em particular Imunoglobulinas G – IgG) no sangue do poldro para confirmar ingestão adequada de colostro de qualidade e absorção intestinal dos anticorpos do colostro. Idealmente a concentração de IgG deverá ser superior a 800 mg/dl.• Confirmação de comportamento da égua de aceitação normal do poldro. Isto é particularmente importante em éguas primíparas.
• O exame clínico do poldro deve descartar os problemas congénitos mais comuns (patência do uraco, hérnias e deformações angulares dos membros) e garantir que o poldro urinou e passou mecónio (primeiras fezes).
AS DUAS PRIMEIRAS SEMANAS
Durante as duas primeiras semanas, são normais os seguintes eventos:
• O poldro costuma dividir o seu tempo em porções iguais a mamar, brincar e dormir. Poldros saudáveis devem ser alertas e mamar em média 5 a 7 vezes por hora. Um dos primeiros sinais de doença no potro é uma diminuição do vigor na amamentação e distensão do úbere da égua.
• A temperatura corporal do potro varia entre 37.2 e 38.9 ºC, a frequência cardíaca entre 70-80 batimentos por minuto e a frequência respiratória entre 20-40 respirações por minuto.
• Alterações fisiológicas normais na flora bacteriana do trato intestinal causam uma diarreia transitória entre o 8º e 10º dias após o parto. Se a diarreia persistir, ou se o potro se encontrar deprimido, deve contactar o seu médico veterinário.
• Começam a aparecer mais dentes de leite – os incisivos centrais normalmente detetam-se logo após o nascimento ou durante a primeira semana de vida. De igual modo, os pré-molares eruptam nas duas primeiras semanas.
• Deve limpar-se diariamente o umbigo com uma solução desinfetante e as hérnias, quando presentes, devem ser vigiadas e reduzidas manualmente com frequência.
DAS DUAS SEMANAS AOS DOIS MESES
Uma regra básica nesta fase é providenciar alimento ao potro de modo a proporcionar um aumento de peso diário de cerca de 500 gramas a 1.5 quilo dependendo da raça e constituição individual. O potro geralmente começa a ingerir sólidos entre as 4 e 6 semanas de idade. Além da forragem e água fresca, o potro pode começar a comer ração, especialmente formulada para poldros lactantes, em duas a três refeições diárias. É comum os criadores desejarem que os seus poldros sejam grandes; no entanto é altamente desaconselhável alimentar em excesso de modo a promover o crescimento. Poldros com excesso de peso ou com surtos de crescimento muito rápido correm um risco aumentado de desenvolver doenças ortopédicas durante o desenvolvimento, como por exemplo osteocondrose.
Durante este período deve tambem notar-se o seguinte:
• Nos machos os testículos devem ser palpáveis no escroto aos 2 meses de idade,
• As hérnias benignas terão resolução espontânea,
• Os dentes incisivos de leite médios eruptam entre as 4-6 semanas
• As deformações angulares ao nível dos boletos devem ser corrigidas nesta fase (a partir dos 2 meses torna-se bastante mais difícil).
DOS DOIS AOS QUATRO MESES
Durante este período existe uma grande incidência de diarreias e doenças respiratórias. Os agentes mais comuns são as bactérias Rhodococcus equi, Salmonelas e Clostridios, e também o Rotavírus e o Herpes vírus Equino (Tipo 4). Infestações parasitárias intensas são comuns e podem resultar em impactações por ascarídeos nos intestinos. Alguns tipos de diarreia são altamente contagiosos e potencialmente fatais, podendo requerer tratamento intensivo. Sinais de doença intestinal que por vezes precedem o aparecimento da diarreia incluem cólica, diminuição ou perda de apetite, depressão e por vezes distensão gasosa do abdómen. Nunca deve ignorar um episódio de diarreia. Se um poldro exibe sinais de diarreia ou de doença respiratória (tosse, corrimento nasal, febre, dificuldade em respirar ou aumento da frequência respiratória), deve chamar com urgência o seu médico veterinário. Quanto mais novo for o poldro mais graves poderão ser as consequências.É costume fazer a primeira desparasitação nesta fase. Deve falar com o seu médico veterinário sobre qual o melhor produto a utilizar. Um exame às fezes para pesquisa de presença de ovos de parasitas ajuda a determinar se o plano de desparasitação está a ser eficaz.
DOS QUATRO AOS SEIS MESES
O evento mais stressante no primeiro ano de vida do poldro é o desmame. Poldros saudáveis lidam melhor com esta alteração dramática que tipicamente implica transições do estilo de vida, alterações na dieta, interações com outros poldros e perda da supervisão maternal. Nesta fase os poldros correm um maior risco de contrair doenças infeciosas e úlceras induzidas por stress. Sinais clínicos de úlceras gastrointestinais incluem cólicas de grau moderado e recorrentes, ranger dos dentes e aspeto corporal pouco saudável.
É costume iniciar o programa de vacinação contra o tétano a partir dos 4 meses de idade e contra a gripe a partir dos 6 meses. De modo a ativar o sistema imunitário do poldro e garantir proteção continua contra estas doenças, é necessária uma série de vacinações repetidas o que geralmente se denomina de “primovacinação”.
Nesta fase tambem costumam ocorrer os seguintes eventos:
• Erupção dos dentes de lobo entre os 5 e 6 meses,
• Todas as hérnias deveriam ter resolvido. Se persistir alguma hérnia, está indicado o tratamento por cirurgia,
• As deformações angulares ao nível do carpo devem ser corrigidas até aos 6 meses (a partir desta idade torna-se bastante mais difícil).
INCLUA O SEU VETERINÁRIO
A assistência de um médico veterinário é uma parte essencial no maneio de um poldro. Pequenos deslizes durante este período de rápido desenvolvimento músculo-esquelético, juntamente com um sistema imunitário pouco eficiente que tem de enfrentar várias doenças víricas e bacterianas, parasitismo e o stress do desmame, podem ter um impacto significativo na saúde futura e desempenho atlético do seu poldro. No entanto, ao garantir o envolvimento regular do seu médico veterinário durante os primeiros meses de vida do seu poldro, pode estar a promover um estado de saúde duradouro.
2015.04.07