Tacto nas mãos, tacto nas pernas, tacto no «assiete» e tacto na cabeça, eis a imagem do cavaleiro artista, do cavaleiro fino. Quem quiser praticar bem a Equitação Artística, a Equitação de Alta-Escola, não pode pensar em resolver os problemas pela força, mas sim com finura, estabelecendo uma linguagem de fácil compreensão do cavalo.
A Equitação de Alta-Escola é uma conversa entre cavalo e cavaleiro.
Essa conversa não é rude, mas sim cheia de subtilezas.
“Le ressembler continuel, non plus même seulement dans les mouvements de côte ou tournants, mais dans tous les movements, quelles que soient leurs combinaisons, c’este le raffinement suprême, c’est la pleine possession de l’ideal» – James Fillis «Principes de Dressage et d’Equitation», pág. 163.
Quando se chega a este estado de coisas, deixou-se de praticar Desporto, e entrou-se francamente no domínio artístico. E arte só se compreende com requintada finura e subtileza
Possuí tacto equestre o cavaleiro que sem estar imbuído de princípios de apoio ou encosto contínuo, ou ainda de não apoio, e constantes baixadas de mão, sabe, ou não, mais correctamente, pressente, quando deve encostar o cavalo, ou quando deve baixar a mão.
O tacto equestre não se ensina; nasce com o cavaleiro, aperfeiçoando-o o mestre que sabe ver a qualidade dos seus alunos.
Quantos e quantos cavaleiros que pretendem ensinar os seus cavalos a executar a “passage”, não o conseguem, ou só o conseguem com resultados muito sofríveis, apesar do cavalo ter propensão para executar esse ar?
O erro está em que, não se apercebendo das primeiras suspensões ou cadenciamento do trote, insistem, aplicando esporas e rédeas, e provocando um estado de nervosismo ao cavalo, que sempre se manifesta, com nova e idêntica exigência.
O cavaleiro que possui tacto afaga ao mais ligeiro indício, e, quando pede novamente, o cavalo responde calmo, confiado e com prazer.
O que é necessário não esquecer, a recomendação que o capitão Beudant nos dá, no seu livro «Mains Sans James»: “Pedir muitas vezes, afagar muito, contentar-se com pouco”.
Como é que um cavalo, que inicia por exemplo o trote espanhol, pode manter este violento exercício durante duas ou três voltas de picadeiro, conservando o brilhantismo inicial?
O cavaleiro sem tacto, quando sente o cavalo menos brilhante, usa as esporas, e o resultado não é o que ele espera, mas sim o começo duma luta, em que o cavalo se irrita, fatigado e desorientado.
Pelo contrário, com o cavaleiro possuidor de tacto e sensibilidade, o cavalo sabe que não o fatigam, e que nunca se lhe exige mais do que as suas possibilidades.
Possuo um velho cavalo que executa perto de 500 passagens de mão, tempo a tempo, sem se fatigar, e montado por qualquer cavaleiro identificado com este ar.
Para chegar a este estado, com certeza não o violentei de entrada, antes pelo contrário, usei de tacto, sabendo quando havia de parar, quando havia de afagar, e quando havia de recomeçar.
Quantos cavaleiros se queixam que os cavalos pesam na mão, quando afinal de contas são eles que pesam, não cedendo, e impedindo que o cavalo se aligeire?
Quantos cavaleiros se queixam, que o cavalo pesa sobre determinada rédea, esquecendo-se, antes disso, de o endireitar com as pernas, ou fixar a rédea contrária, a aligeirar essa rédea, tocando piano com os dedos nela?
Para o cavaleiro que sente bem o seu cavalo, quer dizer, logo que obteve o «rassembler» perfeito, o acordo, a união do cavaleiro e cavalo são tais que a força da impulsão e os efeitos de conjunto são transmitidos e passam dum para o outro sem transição nem interrupção.
Não se pode conseguir um «rassembler» perfeito sem o cavalo estar completamente direito.
Creio ser a mais fundamental noção de tacto equestre sentir quando o cavalo está direito ou quando se vai entortar.
O tacto equestre só o pode possuir o homem que ama o cavalo, que o compreende, e que o sente.Quantas e quantas vezes se insiste com um cavalo, em determinado exercício ou posição, chegando mesmo à violência, sem se aperceber que a resistência é provocada por uma deficiência física?
Tem sucesso certo o cavaleiro que estuda o cavalo, que lhe dá um ensino baseado numa compreensão mútua, feito a pouco e pouco, sem pressas e, sobretudo, resolvendo a questão fundamental, da posição a dar a cada cavalo, para executar determinado exercício.
Para se chegar a um alto nível equestre, é necessário ter conhecimentos técnicos profundos. Porém se não se possuir tacto equestre, de nada servirão esses conhecimentos. É preciso sentir, de momento, a maneira como se deve actuar.
Ao bom professor, ao mestre, está na mão desenvolver esse tacto nos alunos, que ele viu ou apercebeu possuírem-no. Quantos e quantos cavaleiros extraordinários não poderia haver, se os tivessem aproveitado bem, desenvolvendo-lhes o tacto equestre nato que possuíam?
Não se pode deixar morrer, nesta época de velocidades e de maquinetas complicadas, a Equitação, essa extraordinária e requintada arte.
Estou convencido que quem chegar até uma certa craveira artística, jamais deixará de se interessar pela Equitação
In “Breves Notas Sobre uma Arte Apaixonante” (A Equitação)