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Opus 72 – o pequeno grande cavalo

Luís Pidwell

Conheci o Opus no dia 29 de Dezembro de 1992 nos Alburejos em casa do “rejoneador” Álvaro Domecq (Alvarito), grande cavaleiro e figura impar no meio equestre e tauromáquico espanhol e mesmo mundial.

O Opus tinha 20 anos, vésperas de 21 e estava na cocheira da “Finca”, numa boxe, mas preso a uma corrente de ferro como se de uma fera se tratasse, nem todos os outros cavalos que o acompanhavam tinham o mesmo mau tratamento.

Pensei para comigo, mas que fera será essa! Para merecer tais cuidados, – ainda hoje conservo essa corrente como recordação, pois ela acompanhou-o até minha casa, embora nunca mais a tivesse utilizado.

Alvarito Domecq, nesse dia, desempenhou o papel de perfeito anfitrião mostrando-nos todos os seus cavalos, touros, a Finca, a casa e restantes instalações que diga-se de passagem são formidáveis e nos causaram grande admiração. E como é óbvio o Opus 72 que vimos, ‘por ele próprio montado, evoluindo como se de um poldro se tratasse.

Tínhamos chegado a este ponto, a minha mulher e eu, acompanhados por Francisco Cancela de Abreu, porque vários dias antes, a um serão dando voltas à cabeça acerca do modo como melhorar rapidamente a nossa coudelaria, nos ocorreu que poderíamos tentar comprar o Opus.

Não foi, confesso um grande rasgo de imaginação, pois já anteriormente o Arsénio Cordeiro havia importado o “Novilheiro” e algum tempo depois, o Vasco Freire, importou o “Neptuno” seus irmãos.

Se assim o pensámos melhor o fizemos, contactámos o Francisco Cancela de Abreu que por sua vez contactou Alvarito e assim fomos recebidos nos “Alburejos” como se de gente importante se tratasse.

Depois de um esplêndido almoço, servido por criado fardado e tudo quanto lhe é dado, eis-nos na sala com toda a família Domecq, discutindo a compra do Opus.Eu, com alguma ingenuidade, tinha ido para lá comprar e trazer o cavalo a troco de meia dúzia de “tostões”, porém quando nos preâmbulos da conversa, a mulher do Alvarito ia dizendo que não quereria separar-se do cavalo a menos que fosse muito bem vendido e o seu sogro, a meu lado, ia constantemente recesindo entre dentes, mas de forma que eu ouvisse bem, “Este caballo ainda nos vai ahacer muchas faltas”, então entendi quão ingénuo tinha sido e onde na realidade estava metido.É claro que finalmente o preço da transação foi anunciado e a minha surpresa não podia ter sido maior, o valor pretendido era exorbitante e excedia largamente as minhas expectativas mais pessimistas.

Feitas as despedidas e a caminho de Portugal, lembro-me que por alturas de Sevilha, duas ideias ocupavam e absorviam por completo o meu pensamento, a primeira era a imagem do olhar límpido, profundo e transparente do Opus que me havia atingido de uma forma tão marcante, revelando um carácter de nobreza e lealdade tão grandes, que ainda hoje, passados quase 10 anos, recordo como se fosse ontem.

A outra ideia, menos romântica, era a enorme quantidade de dólares que teria de reunir para trazer aquele olhar para junto de nós, para a Coudelaria de Santa Margarida.

Os dois dias que se seguiram foram passados na busca de um ou mais sócios para concretizar dessa forma, em sociedade, uma aquisição que era de risco, pela idade do cavalo diminuindo também os custos da compra através da divisão.Foi assim que acabei dando sociedade na compra, ao meu amigo Pedro Ferraz da Costa e em boa hora o fiz porque em todos estes anos tudo correu pelo melhor. E estou certo que ele próprio não estará arrependido por ter aceite o convite que lhe fiz.

O Opus foi-nos entregue pelo Alvarito em pessoa na fronteira Espanhola com pompa e circunstância no dia 22 de Fevereiro de 1993 já com 21 anos e chegou depois à Coudelaria de Santa Margarida onde houve almoço, muita alegria e muitos convidados para o receber; a partir daqui tornou-se acontecimento nacional, TV, revistas e jornais fizeram eco do acontecimento e de par com as verdades surgiram também muitas especulações.

No meio Coudélico Nacional surgiram também duas correntes de opinião como é natural, uns felicitavam-me por ter adquirido tão bom cavalo e desejavam-me os maiores sucessos com ele, outros iam dizendo, por vezes de tal forma que pudesse rapidamente chegar aos meus ouvidos, que tinha sido um disparate comprar o cavalo, que nunca o cavalo iria servir de nada, primeiro porque o Opus não prestava, nunca sequer tinha toureado de jeito, o Neptuno é que era bom, segundo, porque não seria também um bom pai, se o Alvarito tinha bons cavalos de toureio filhos dele, era porque eram filhos de éguas excelentes, descendentes de uma tal “Esplendida”, o Opus não passava de um garrano e as minhas éguas não valiam um pataco, por isso!!!Como porém nem todos são “velhos do Restelo”, houve nestes primeiros tempos, muita gente que me telefonou, escreveu e até visitou para me felicitar, congratulando-se com o facto e houve até quem viesse de propósito e do estrangeiro para estar com o cavalo e com ele ser fotografado.

O Opus começou a cobrir na época de 1993, cobriu muitas éguas, cobriu como é natural éguas da Coudelaria de Sta. Margarida, de Ferraz da Costa, de Manuel Veiga, do Monte da Ravasqueira, de Pedro Passanha, de José Fontes, de Manuel Vieira, de David Ribeiro Teles, das Silveiras, de Vasco Freire e algumas outras coudelarias, porém à medida que os anos passavam fomos restringindo as cobrições para fora.

Quando os produtos começaram a nascer e a crescer, aquilo que era uma esperança, começou a tornar-se cada vez mais uma certeza, os poldros eram na maioria muito bonitos, especialmente os que eram netos do “Universo”, garanhão de ferro Veiga que utilizámos durante 12 anos na coudelaria e que produziu as éguas que deram ao Opus a oportunidade de se tornar em Portugal um dos mais famosos garanhões da actualidade.

Então e para finalizar, é assim desta maneira simples, mas determinada, que este pequeno grande cavalo, por uns odiado por outros amado, teimando em viver e fazer filhos muito para além do que lhe seria exigido – hoje com 29 anos de idade e mais de 120 filhos – levou a Coudelaria de Sta. Margarida, ao lugar onde hoje se encontra.

Com tantos filhos vamos de certeza, nós e os vinduros, ouvir falar do Grande “Opus-72” por muitos e muitos anos, para além de nós, proprietários da Coudelaria de Sta. Margarida, que em si, não é mais do que o meio de perpetuação do cavalo Lusitano, através de um dos seus membros mais ilustres, o Opus-72, uma verdadeira força da natureza.

Às Coudelarias Veiga e Andrade, que lhe deram vida, um bem hajam!

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