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Problemas de Claudicação

Texto: Dr. Herique Cruz MV

Problemas de claudicação no cavalo constituem 50 a 80% dos casos que justificam a intervenção do médico veterinário, e são um dos principais factores que contribuem para uma má carreira desportiva e final da vida atlética do cavalo.

Claudicação vem definida em muitos livros como uma alteração do movimento normal do cavalo, podendo ter três origens distintas:

1) Claudicação de origem mecânica.

2) Claudicação de origem neurológica.

3) Claudicação de origem dolorosa.

Estes três tipos podem aparecer associados, mas em termos práticos o mais normal é sermos consultados para investigar uma claudicação de origem dolorosa.Esta dor pode ter graus muito variados. Assim temos num extremo, por exemplo o cavalo com uma fractura completa dum osso que não apoia o membro no chão “andando” literalmente em três pernas, que mesmo um leigo identifica; e noutro extremo uma dor muito ligeira, por exemplo numa articulação que perturba o cavalo aquando da batida para um salto e faz com que ele toque nas varas ou se recuse a saltar, mas quando se observa este cavalo não se identifica qualquer anomalia. No meio da escala temos os vários graus de claudicação que podem ser mais ou menos óbvios, dependendo da acuidade e experiência do observador. Uma vez convencidos que o animal claudica, o primeiro passo é identificar qual o membro, ou membros, afectados. Para isso vamos observar o cavalo a andar a passo numa linha recta e numa superfície plana, prestando particular atenção à simetria do movimento, comprimento da passada, aprumos e modo como o cavalo apoia o casco no solo. De seguida deve-se do mesmo modo observar o cavalo a trote. Para complementar o exame, principalmente no caso de claudicações ligeiras, pode-se ainda observar o cavalo à guia trotando para ambas as mãos: este teste torna-se bastante significativo quando realizado numa superfície dura.

Os testes de flexão, realizados pela maioria dos médicos veterinários, consistem em flectir passivamente os membros e respectivas articulações o que vai exercer forças de pressão e tensão em diversas estruturas tais como ligamentos e cápsulas articulares. Deste modo é possível realçar focos inflamatórios ligeiros evidenciando dor, o que faz com que a claudicação seja acentuada após o teste de flexão.Depois de identificado o membro em que o cavalo claudica é fundamental localizar nesse membro o foco doloroso. É aqui que se torna fundamental o conhecimento da anatomia e experiência do médico veterinário.  Casos há em que o problema é mais óbvio do que os outros. Um exame detalhado feito pelo médico veterinário pode às vezes identificar ou levar a suspeitar onde se encontra o problema. Contudo há situações em que não se identificam quaisquer anomalias na anatomia do membro em questão e no entanto o cavalo claudica. Infelizmente os animais não falam e não nos podem dizer onde é que dói! Se a dor não for suficiente para o cavalo reagir quando se pressiona ou manipula o foco doloroso, pode ser difícil dizer com certeza onde se localiza o problema.Ao contrário da opinião de muita gente, eu não acredito que seja possível identificar onde se localiza o foco doloroso baseado apenas na observação do andamento do cavalo. Se um cavalo tem dor num membro, ele claudica de modo igual esteja a dor no casco ou no ombro; o único factor que afecta o andamento e consequentemente a claudicação é o grau de dor que o animal sente nesse preciso momento. Daí a importância dum meticuloso exame físico.

Para confirmar a suspeita dum problema, ou para identificar um foco doloroso quando o exame clínico é inconclusivo, o médico veterinário pode utilizar técnicas de diagnóstico como a infiltração de anestésico local ou anestesia intra-articular. Estes testes dessensibilizam selectivamente determinadas regiões no membro permitindo confirmar ou eliminar a presença de dor. Assim, comparando o grau de claudicação antes e depois da realização do teste, é possível identificar uma melhoria no grau de claudicação caso o foco doloroso tenha sido dessensibilizado; posto isto pode-se assumir que a dor se localiza nessa região. Caso contrário o grau de claudicação manter-se-á igual, neste último caso repete-se o teste dessensibilizando-se outra região, obviamente; e assim sucessivamente.Uma vez localizado o foco doloroso numa região concreta do membro, o médico veterinário vai então explorar meticulosamente essa região recorrendo a ajudas de diagnóstico como os rais X para investigar lesões ósseas ou articulares, ou ecografia para investigar problemas dos tecidos moles como músculos, tendões ou ligamentos. Depois de identificada a lesão o médico veterinário está então em condições de propor um tratamento adequado.

Para concluir, fica a mensagem de que a investigação de uma claudicação pode ser simples e durar 5 minutos, como é o caso dum abcesso no casco, mas pode também contudo durar várias horas, às vezes dias, em situações crónicas como por exemplo um grau ligeiro de doença degenerativa articular (DDA) do ombro.  É importante neste último caso ter paciência e compreensão para evitar situações de frustração e desistência. Há que resistir à opinião dos ditos “entendidos” e cumprir à letra as instruções do médico veterinário cujo objectivo é diagnosticar os problemas a fim de poder oferecer um tratamento, beneficiando o cavalo e satisfazendo o cavaleiro e treinador.

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