Carta aberta ao Presidente da Federação Equestre Portuguesa
Acaba de nos chegar uma carta aberta do Dr. Luís Júdice Faísca, que renuncía aos cargos de Vice Presidente da FEP e Selecionador Nacional, que abaixo transcrevemos na integra :
Exmo. Senhor
Presidente da Federação Equestre Portuguesa,
Dirijo-me a V. Exa. para o informar das razões da minha renúncia ao cargo de Vice Presidente da F.E.P. e Selecionador Nacional, operada através de comunicação escrita já remetida e aceite ao Presidente do Congresso.
Quando aceitei integrar a lista encabeçada por V. Exa. que ganhou as últimas eleições para os órgãos sociais da FEP, fi-lo com total compromisso com os princípios que julgo serem essenciais para o exercício do cargo, nomeadamente de legalidade, imparcialidade e transparência.
Durante os primeiros três anos do meu mandato, mantive uma colaboração estreita e sã com todos os órgãos da FEP e com todos os agentes desportivos, sempre movido pelo espírito de procura das melhores soluções para a disciplina da Dressage. Neste período, com a ajuda de todos, foi possível desenvolver muito trabalho em prol da Dressage, de que me orgulho, destacando a revisão e atualização de regulamentos, a formação e promoção de Oficiais, a agilização do calendário desportivo, digitalização de processos e a criação de melhores condições para as equipas nacionais nos diferentes escalões através da promoção do Programa de Preparação para a Competição de Alto Rendimento.
Fruto do muito trabalho, dedicação e altruísmo de uma equipa de que me rodeei, e sempre fiel aos referidos princípios éticos de que não abdico, ajudei a preparar e selecionei as nossas equipas que tiveram participações notáveis no último Campeonato da Europa de U25, nos Jogos Olímpicos de Tóquio, Campeonato do Mundo de 2022 e Campeonato da Europa de 2023.
Na verdade, conforme consta do documento “Reflexão de Dressage – 2023”, o qual V. Exa. ajudou a redigir, desde o início deste mandato que a Dressage mostrou um importante desenvolvimento a todos os níveis (número de Atletas, de competições, de representações nacionais, qualidade de resultados, formação e promoção de oficiais, etc.)
Tudo parecia bem encaminhado para o grande desafio que são os próximos Jogos Olímpicos de Paris. Porém, desta vez, em resultado de lobbies e pressões exteriores que, infelizmente, acontecem nestes momentos, em claro abuso de poder e usurpação de funções, à revelia dos estatutos da FEP, entendeu V. Exa. intrometer-se na organização da preparação desportiva e participação competitiva das Seleções Nacionais, desautorizando-me e desrespeitando-me ao atribuir poderes manifestamente excessivos e quase absolutos, que se sobrepõe aos meus, à treinadora nacional da equipa de seniores no que respeita ao plano de preparação e seleção da equipa para os Jogos.
Em face desta decisão, a treinadora tudo tem feito a seu belo prazer, adotando comportamentos de total desrespeito pelo cargo que ocupo e alterando aleatoriamente o plano traçado com os Atletas, ao qual tinha dado parecer e acordo.
Muito recentemente, sem que eu tenha sido consultado ou sequer informado, a poucos dias do fecho das inscrições da Competição de Dressage Internacional Oficial de 5* de Compiègne (Taça das Nações), – onde Portugal tem participado de forma regular nos últimos 3 anos, tendo inclusive, já conseguido um lugar no pódium –, a treinadora incentivou os Atletas a não participarem nesta competição, tendo colocado Portugal numa situação sensível perante a Comissão Organizadora do evento!
A justificação apresentada pela treinadora é que receava que a “protetora dos animais” estivesse presente na competição!
Reservo-me no direito de não tecer qualquer comentário sobre tal justificação, sublinhando apenas que raramente Portugal é convidado para competições oficiais de 5*, este ano 7 dos 8 oficiais que vão julgar os Jogos Olímpicos estavam a oficiar em Compiègne, e a não comparência, à última da hora, a uma competição desta relevância seguramente que não daria uma boa imagem de Portugal.
No limite do prazo, depois de alguns contatos e graças à compreensão e nacionalismo dos Atletas, foi possível apresentar uma equipa na Taça das Nações de Compiègne, no entanto, entendeu a treinadora nacional não estar presente!
Como alternativa a Compiègne, entendeu a treinadora, incentivar os Atletas a competirem em Hagen – Alemanha, no entanto, cabe dizer que o número de Atletas que manifestou a intenção de competir quer em Hagen quer em Compiègne era suficiente para que Portugal estivesse representado em ambas as competições.
Sobre a competição em Hagen, cumpre-me registar que muito estranho que tendo sido esta a competição “eleita” pela treinadora, esta tenha decidido abandoná-la antes do seu término, tendo os conjuntos que foram apurados para o Grande Prémio Especial do CDI4* ficado privados da presença da treinadora nesta importante prova!
Tudo o que acima refiro causa-me uma enorme perplexidade, mas para além disto, com ainda maior gravidade é o facto de há poucos dias ter recebido, por diversas vias, a informação que a treinadora tem a intenção, de alterar a Circular publicada em 19 de Janeiro de 2024 onde constam os “Critérios de Seleção para os Jogos Olímpicos – Paris 2024”!
Esta intenção é, no mínimo, surpreendente e consubstancia, em si mesmo, uma intolerável falta de transparência e uma injustiça para todos os Atletas que se estão a esforçar por cumprir tais critérios.
Pode-se agora perguntar o que está por detrás desta intenção, uma vez que tal alteração apenas beneficiaria aqueles que, não os conseguindo cumprir os critérios de seleção, passariam a ser elegíveis e a beneficiar do livre arbítrio da treinadora!
É importante não esquecer que, sendo público e notório os interesses económicos da treinadora, nomeadamente pela sua ligação profissional a vários atletas, aos quais dá aulas particulares, como também à Associação de Criadores de Cavalos de Raça Puro-Sangue Lusitano (que promove a raça Lusitana e naturalmente lhe interessa a promoção dos cavalos Lusitanos), é evidente que a mesma, com os poderes que lhe estão agora a ser conferidos, atua numa intolerável situação de conflito de interesses, situação que é inequivocamente contrária aos princípios de legalidade, imparcialidade e transparência dos quais não abdico, motivo pelo que não posso compactuar com esta situação!
Por tudo isto, a renúncia ao cargo de Vice Presidente da F.E.P. e Selecionador Nacional não é mais do que a formalização da situação que na prática já vem a acontecer desde que V. Exa. decidiu desautorizar-me e conceder poderes manifestamente excessivos à treinadora nacional.
Por fim, devo sublinhar que tudo o que acima deixei dito está devidamente documentado, e estou naturalmente disponível para prestar esclarecimentos perante o Congresso da F.E.P, o Comité Olímpico de Portugal ou em qualquer outra instituição ou sede, caso assim seja necessário, reservando-me no direito de tornar pública a presente carta, de forma a defender a minha reputação, o rigor, a transparência e o profissionalismo que todos os assuntos relacionados com a Dressage foram tratados até ao momento em que V. Exa. decidiu proceder da forma acima descrita.
Atentamente,
Luís Júdice Faísca