NotíciasTauromaquia

Touradas: sobre a coragem e a verdade no século XXI

Orson Welles, um norte-americano genial e apaixonado pela tauromaquia, disse que “os toureiros são actores a quem acontecem coisas de verdade”. Esta é uma das essências da tauromaquia: a verdade. Na arena, todos os que participam nesta arte performativa ética, sejam toureiros, cavaleiros, forcados ou bandarilheiros, assumem que a verdade é uma companheira constante e inseparável. Verdade que se pode manifestar no triunfo, ou no seu máximo inverso, a morte. Verdade que obriga todos estes intervenientes a exporem a sua vida ao toiro, como exigência ética fundamental de respeito por este animal admirado e amado.

Mas por que razão enfrentam estes homens um animal com cerca de 600 quilos que lhes pode tirar a vida? Desde o início da humanidade os homens sempre quiseram testar os limites, colocar-se perante a adversidade e superá-la. Viver a vida com especial intensidade. Por que há-de alguém saltar de pára-quedas ou surfar uma onda com 30 metros? Essa é também a história dos forcados. Homens que arriscam a sua vida por afición e amor ao toiro bravo, sem ganharem qualquer dinheiro por isso, sendo completamente amadores.

Os forcados em particular, e a tauromaquia em geral, ensinam–nos a superar os nossos medos, a enfrentarmos o perigo com tranquilidade e elevação, a enfrentarmos a vida de frente e a “pegarmos o toiro pelos cornos”. Ensinam–nos a importância de colaborar com os outros, a agir em grupo, sendo solidários nos momentos mais difíceis, aqueles que exigem esforço e dádiva pessoal, arriscando até a própria vida para ajudar o próximo. Aprendemos que unidos conseguimos ir ainda mais longe e que todos dependemos de todos, que sem a ajuda do “grupo” nunca pegaríamos qualquer “toiro” que a vida nos põe no caminho. A superação, a coragem, o humanismo e a solidariedade que encarnam são um exemplo de excelência humana, que nos inspira a todos e nos torna melhores pessoas. Por isso vamos às praças ver touradas e temos orgulho em sermos aficionados.

Há uma frase marcante e que retrata na perfeição todos aqueles que pisam uma arena: “Aprendi que a coragem não é a ausência do medo, mas o triunfo sobre ele. O homem corajoso não é aquele que não sente medo, mas o que conquista esse medo”, disse Nelson Mandela. É este exemplo que o Pedro Primo e o Fernando Quintella nos deram com a sua vida e com a sua presença nas arenas. Saibamos todos honrar o seu legado e os valores pelos quais deram a vida.

No reverso da medalha, o “Projecto Tauromaquia, Património Cultural de Portugal” foi um dos dois vencedores nacionais do Orçamento Participativo, entre 600 projectos, lançado pelo governo. O projecto visa inserir a cultura tauromáquica na lista de Património Cultural Imaterial de Portugal, ao abrigo da Convenção da UNESCO para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial.Esta vitória é um exemplo do envolvimento cívico e democrático dos portugueses que disseram de forma clara que querem a valorização e salvaguarda do nosso património cultural e que querem a tauromaquia declarada como Património Cultural Imaterial de Portugal (PCI).

O Ministério da Cultura é agora o responsável por executar o projecto vencedor em 24 meses, apoiando os municípios no levantamento do património tauromáquico, fazendo um retrato nacional da cultura taurina e registando pelo menos duas práticas taurinas no Inventário Nacional de PCI.

As causas da cultura e da liberdade nunca têm data de validade. Este resultado mostra um notável dinamismo no universo taurino nacional mas também uma consciência social dos portugueses de que a cultura e o património são, no século XXI, factores determinantes dos povos e uma das maiores riquezas identitárias, simbólicas e mesmo económicas, que nos diferenciam e nos tornam únicos num mundo globalizado e em avançado processo de uniformização. O direito à diferença e à cultura são valores fundamentais que todos comungamos e que todos temos de respeitar. Venceu a democracia e a cidadania.

Comissão Executiva ProToiro – Federação Portuguesa Tauromaquica

X